Caio Bonfim vira no quilômetro final e leva ouro nos 20 km da marcha no Mundial de Tóquio

Ouro histórico em Tóquio

Caio Bonfim guardou o golpe final para a hora certa. Numa chegada de tirar o fôlego, o brasileiro venceu os 20 km da marcha atlética no Mundial de Atletismo de Tóquio, nesta sexta-feira, 19 de setembro, com 1:18:35. O chinês Wang Zhen cruzou oito segundos depois (1:18:43), e o espanhol Paul McGrath veio logo atrás (1:18:45). A ultrapassagem no quilômetro final, sobre Wang, o francês Aurélien Quinion e o próprio McGrath, selou um ouro que já nasce com cara de capítulo histórico para o atletismo do Brasil.

O roteiro não foi de quem lidera do começo ao fim. Durante boa parte da prova, Caio circulou entre os cinco primeiros, sem gastar energia à toa. A leitura de ritmo funcionou quando a disputa apertou. Na marca dos 13 km, ele mudou de marcha e se posicionou no grupo que filtrava os candidatos ao pódio, ao lado de um japonês e dois chineses. No 15º km, ficou claro: havia ouro na mesa. A reta final confirmou.

Para a carreira, o título mundial nos 20 km se soma a um currículo pesado: prata olímpica em Paris 2024, outra prata nos 35 km já em Tóquio e dois bronzes em Mundiais anteriores (Londres 2017 e Budapeste 2023). O ouro de agora tem um sabor especial por um motivo simples: consagra o brasileiro no evento que define gerações da marcha atlética. E, para o país, é um marco inédito na modalidade.

O cenário também pesou. Tóquio em setembro traz calor e umidade que punem qualquer vacilo técnico. Marchar forte sem tomar advertências, mantendo a cadência legal e a postura firme, pede cabeça fria. Caio entregou isso. O tempo abaixo de 1h19 coloca a performance no patamar das grandes marcas do circuito e explica o porquê de a prova ter se decidido no detalhe, na coragem de acelerar quando o corpo já pede alívio.

Como a prova foi vencida — e o que muda para o Brasil

Como a prova foi vencida — e o que muda para o Brasil

A chave do ouro esteve em três movimentos: segurar no começo, atacar quando o pelotão afina e sustentar a técnica no limite. O brasileiro executou a cartilha que os especialistas repetem — e que muitas vezes falha no calor da disputa. Aqui, ela funcionou com precisão.

  • Primeiros 10 km: economia de energia, marcação dos rivais, corpo sempre solto e cadência estável.
  • Entre 13 km e 15 km: mudança de ritmo para entrar na briga real pela liderança, sem romper a técnica.
  • Último km: aceleração firme para passar Wang Zhen e neutralizar a resposta de McGrath e Quinion.

Os adversários valorizam o resultado. Wang Zhen é campeão olímpico no Rio 2016 e tem faro para chegada. McGrath representa a nova geração de uma escola espanhola que há décadas domina a marcha. Quinion cresceu muito no ciclo e apareceu no momento certo. Bater esse trio, nesse contexto, dá a medida do que Caio construiu no Japão.

Há também a história por trás do atleta. Caio é produto de um projeto de longo prazo, lapidado em casa, com a mãe e treinadora, Gianetti Bonfim, e anos de calendário internacional na veia. A evolução foi passo a passo, do top 10 ao pódio, até virar referência. O ouro em Tóquio fecha o arco: agora ele não é só consistente — é o homem a ser batido.

Para a marcha atlética brasileira, o impacto é imediato. A visibilidade cresce, a base ganha um espelho e a modalidade entra numa conversa maior dentro do esporte nacional. Títulos desse peso costumam destravar apoio, consolidar equipes multidisciplinares e dar fôlego para renovar talentos. É a hora de capitalizar.

O que vem pela frente? Calendário cheio, com foco em manter saúde e qualidade técnica, porque a margem entre vitória e frustração na marcha é milimétrica. Com a confiança de quem venceu um Mundial, Caio ganha também a liberdade de escolher melhor as batalhas e afinar picos de forma para as provas-alvo.

As medalhas que contam a jornada:

  • Ouro — 20 km, Mundial de Tóquio (1:18:35)
  • Prata — 20 km, Jogos de Paris 2024
  • Prata — 35 km, Tóquio
  • Bronze — 20 km, Mundial de Londres 2017
  • Bronze — 20 km, Mundial de Budapeste 2023

Foi um ouro com assinatura: leitura perfeita da prova, técnica sob pressão e coragem para decidir. Em Tóquio, o último quilômetro virou território brasileiro.