O que aconteceu no Festival Vibrar
No feriado de 7 de Setembro, vídeos de um show em Brasília dominaram as redes: no palco do Festival Vibrar, no Parque da Cidade, o cantor capixaba Silva fez críticas diretas a nomes conhecidos da mídia. Em poucos minutos, ele mirou a influenciadora Virginia Fonseca, o apresentador Serginho Groisman e a cantora Luísa Sonza. O tom foi duro e político, e a internet reagiu na mesma hora.
Sobre Virginia Fonseca, que recentemente foi ouvida na CPI das Apostas no Senado por causa de publicidade de jogos online, o artista associou a imagem dela à promoção de apostas para o público. Em um trecho que circulou bastante, ele afirmou que “a menina era pobre e ficou rica” e que, agora, faria “gente pobre perder dinheiro que não tem” ao divulgar plataformas de jogo. Ali, ele tocou num tema que ferve no país: a influência de celebridades na vida financeira de seguidores, principalmente jovens.
Na sequência, ele voltou sua frustração para a TV. Citou o apresentador Serginho Groisman e disse estar cansado de ir ao Altas Horas para cantar covers, e não suas faixas autorais. Mencionou “A cor é rosa”, um de seus maiores sucessos, e prometeu recusar convites se a condição não mudar. A reclamação atinge um formato frequente da TV aberta, onde artistas costumam fazer medleys e homenagens coletivas no palco, muitas vezes priorizando repertórios de grandes clássicos.
Por fim, o cantor fez uma provocação sobre financiamento de carreira e patrocínios a artistas. Ao comentar o peso do agronegócio no showbusiness, disparou: “Não tenho dinheiro do agronegócio, não sou a Luísa Sonza.” Na mesma fala, reforçou que se vê como independente e disse ter começado “do zero”, sem apoio de grandes investidores. Não houve apresentação de provas no palco; foi uma fala política, com tom de desabafo e crítica ao modelo de mercado.
O público reagiu ali mesmo, com aplausos e vaias divididas, e depois levou a discussão para as redes. De um lado, quem viu coragem e posicionamento. Do outro, quem enxergou contradição e falta de foco. Entre os comentários mais compartilhados estavam “show sensacional, nunca vi ele tão solto, tem que se posicionar” e críticas chamando o discurso de “vazio” e “sem objetivo claro”.
Procurada por veículos de imprensa, a equipe do cantor preferiu não comentar as declarações feitas no palco em Brasília. Até a noite do dia seguinte, os trechos do show seguiam entre os mais vistos no X, no Instagram e no TikTok, impulsionados por perfis de fãs e páginas de fofoca.
Repercussão e contexto
As falas sobre apostas cutucam um nervo exposto. A regulamentação dos jogos online avança no país e trouxe novas regras de publicidade, com restrições para menores e exigências de aviso de risco. Influenciadores que anunciam essas plataformas passaram a ser mais cobrados por público e órgãos de autorregulação. A discussão é prática: até que ponto uma celebridade pode associar sua imagem a um produto que envolve risco financeiro real?
No caso de Virginia Fonseca, o debate mistura sucesso meteórico, audiência gigantesca e a responsabilidade que vem com isso. Quando um criador de conteúdo leva milhões de pessoas a um produto, o impacto é imediato — e, em apostas, pode incluir perdas de dinheiro. A crítica do cantor ecoa essa preocupação, ainda que com um recorte social que incomodou muita gente por generalizar a experiência de quem consome esse tipo de publicidade.
Já a queixa contra Serginho Groisman toca o modo de produção da TV. Programas como o Altas Horas reúnem elencos diversos e montam números coletivos. Músicos, inclusive os mais autorais, muitas vezes encaixam covers para se conectar com o público de sábado à noite. Para quem quer reforçar o próprio repertório, isso pode soar como vitrine limitada. A cobrança é legítima — e não é a primeira vez que um artista pede espaço para cantar sua própria obra no horário nobre.
A provocação sobre patrocínios e agronegócio abre outra frente. O mercado de shows no Brasil depende de aportes de marcas e de setores econômicos variados. É comum que festivais recebam investimentos de grandes empresas, bancos, telecom, bebidas e, em alguns casos, players ligados ao agronegócio. O ponto do cantor foi político: quem banca a cultura influencia o que chega ao palco? Essa pergunta sempre volta quando a música pop cruza com dinheiro grande.
Há também um componente biográfico por trás da revolta. O capixaba construiu carreira misturando MPB e pop, com hits como “A cor é rosa” e projetos de releituras que ajudaram a ampliar o público. O contraste entre um artista que já revisitou obras de outros nomes e a crítica a cantar covers na TV virou combustível para a polêmica. Parte dos comentários lembrou que fazer versões também é um caminho artístico válido; outra parte defendeu a prioridade do autor no horário nobre.
O Festival Vibrar, por sua vez, virou palco de um capítulo que extrapolou a música. O que era para ser mais uma apresentação no fim de semana da Independência virou discurso e pauta nacional em poucas horas. Brasília tem histórico de shows que se transformam em manifesto — e, com celular na mão, qualquer recado vira manchete. Foi o que aconteceu aqui.
Como fica daqui para frente? Em casos assim, o desdobramento costuma vir em três vias: resposta dos citados, impacto em agendas de TV e festivais e, claro, novas falas do próprio artista. Se vier retratação, dobra a discussão. Se vier novo ataque, idem. Por ora, fica a fotografia de um show em que a música dividiu espaço com uma crítica pública ao ecossistema de mídia, publicidade e patrocínio que sustenta a indústria do entretenimento.
- Virginia Fonseca: alvo por divulgar apostas; o cantor associou isso a perdas do público.
- Serginho Groisman: alvo por supostamente priorizar covers no Altas Horas; o artista quer cantar seu repertório.
- Luísa Sonza: citada em crítica a patrocínios ligados ao agronegócio; ele se diz independente.
O que esse episódio mostra, no fim, é que artista que se arrisca a falar de dinheiro, mídia e poder mexe em caixas de som e de surpresa. Nem todo mundo vai aplaudir, nem todo mundo vai vaiar. Mas todo mundo vai ouvir.